A exposição comportamental e ambiental é primordial na determinação do risco cardiovascular. De fato, muito se fala sobre a busca em manter um estilo de vida mais saudável desde cedo como estratégia bem-sucedida para manter uma melhor saúde cardiovascular na meia-idade. No entanto, a capacidade de escolher estilos de vida saudáveis ao longo da vida é fortemente influenciada por fatores de saúde psicológica e determinantes sociais. ⁽¹⁾

Do ponto de vista psicológico, existem vários caminhos diretos e indiretos pelos quais a saúde e bem-estar podem influenciar o risco cardiovascular (RCV). Estes incluem vias fisiológicas (como resposta inflamatória, homeostase de glicose e lipídios e coagulação) relacionadas ao estresse crônico, e efeitos indiretos que tem influência nos comportamentos diante a fatores de resiliência psicossocial. ⁽¹⁾ 

No Congresso Brasileiro de Cardiologia 2022, que aconteceu no Rio de Janeiro entre as datas de 13 a 15 de outubro, um dos assuntos mais comentados foi o Life´s Essential 8, que adiciona o sono saudável como componente essencial para a saúde cardíaca. As doenças cardiovasculares continuam a ser a principal causa de morte a nível mundial, apesar de melhoria significativa das estratégias farmacêuticas e de prevenção. ⁽²⁾

O sono é um elemento fundamental da biologia humana e um requisito para a vida. Embora suas funções sejam amplas e afetem quase todas as funções fisiológicas, estudos epidemiológicos identificaram o sono habitual ruim como um fator de risco para mortalidade ou implicações cardiovasculares. ⁽¹⁾

Estudos populacionais mostraram que a duração inadequada do sono (mais curta ou mais longa do que o ideal) está associada à doença cardíaca coronária. A saúde do sono na população parece ser responsável por algumas das variações na prevalência de risco cardiometabólico, e é conhecida por estar associada a problemas de saúde psicológica. ⁽¹⁾

A AHA definiu pela primeira vez as sete métricas para avaliar a saúde cardiovascular em 2010. Após 12 anos e mais de 2400 trabalhos científicos sobre o tema e novas descobertas na saúde cardiovascular, proporcionaram uma oportunidade de revisitar cada componente de saúde em mais detalhes e fornecer atualizações conforme necessário, de acordo com AHA. ⁽²⁾

Médicos e pacientes podem medir a pontuação Life’s Essential 8 e monitorá-la ao longo do tempo para avaliar a saúde cardiovascular atual de um indivíduo e as oportunidades de mantê-la ou melhorar os resultados de saúde a longo prazo.

Abaixo seguem as atualizações e métricas do Life’s Essential 8: 

1. Dieta

A ferramenta inclui um novo guia para avaliar a qualidade da dieta para adultos e crianças, a nível individual e populacional. Essa nova abordagem fornece um foco nos padrões alimentares dos indivíduos e na ingestão de alimentos integrais, em vez de nutrientes. ⁽²⁾

2. Atividade Física

A atividade física continua a ser medida pelo número total de minutos de atividade física moderada ou vigorosa por semana. O nível ótimo é de 150 minutos (2,5 horas) de atividade física moderada ou mais por semana ou 75 minutos por semana de atividade física vigorosa para adultos; 420 minutos (7 horas) ou mais por semana para crianças com 6 anos ou mais; e modificações específicas de idade para crianças mais novas. ⁽²⁾

3. Exposição a nicotina

A utilização de sistemas inalatórios de nicotina, como cigarros eletrônicos foram incluídos, assim como a exposição ao fumo passivo de crianças e adultos, refletindo suas implicações para a saúde a longo prazo. ⁽²⁾

4. Duração do sono

A duração do sono está associada à saúde cardiovascular, medido por horas médias de sono por noite. O nível ideal é de 7-9 horas diárias para adultos. ⁽²⁾

5. Índice de massa corporal

A AHA reconhece que o índice de massa corporal (IMC) é uma métrica imperfeita, não havendo alterações na forma de mensurar o IMC. No entanto, como é facilmente calculado e amplamente disponível, o IMC continua a ser um indicador “razoável” para avaliar categorias de peso que podem levar a problemas de saúde. O IMC de 18,5-24,9 está associado aos níveis mais elevados de saúde cardiovascular. ⁽²⁾

6. Lipídios no sangue

A métrica dos lípidos no sangue (colesterol e triglicérides) foi atualizada para utilizar o colesterol não-HDL (colesterol de lipoproteína de não alta intensidade) como o número preferido para monitorizar, em vez do colesterol total. Esta mudança é feita porque o colesterol não-HDL pode ser medido sem jejum prévio (aumentando assim a sua disponibilidade a qualquer hora do dia e implementação em mais marcações) e calculado de forma confiável entre todas as pessoas. ⁽²⁾

7. Glicose no sangue

A métrica para glicose no sangue foi atualizada, para incluir a medição de hemoglobina glicada (em indivíduos com ou sem diabetes) e para refletir melhor o controle glicêmico entre pacientes diabéticos. ^(1,2)

8. Pressão sanguínea

Os critérios de pressão sanguínea permanecem inalterados desde 2017, orientação que estabeleceu níveis inferiores a 120/80 mm Hg como ótimos, e definiu hipertensão como 130-139 mm Hg pressão sistólica ou 80-89 mm Hg pressão diastólica. ⁽²⁾

O primeiro estudo utilizando o Life’s Essential 8, veio da análise de 2013 a 2018 do US National Health and Nutrition Examination (NHANES), no qual mais de 13.500 adultos com idade entre 20 e 79 anos e quase 9900 crianças entre 2 e 19 anos foram avaliadas. ⁽²⁾

Entre os seus principais resultados, a pontuação média de saúde cardiovascular baseada no Life´s Essential 8 foi de 64,7 para adultos e 65,5 para crianças em uma escala de 0 a 100; apenas 0,45% dos adultos tinham uma pontuação perfeita de 100, 20% foram considerados com saúde cardiovascular elevado (pontuação de 80+), 63% moderados (pontuação de 50 a 79) e 18% tinham saúde cardiovascular baixo (pontuação de menos de 50). ⁽²⁾

As mulheres adultas tinham uma pontuação média de saúde cardiovascular mais elevada (67) em comparação com os homens (62,5). Em geral, os adultos tiveram a pontuação mais baixa nas áreas da dieta, atividade física e IMC e os resultados de saúde cardiovascular em idosos geralmente eram mais baixos.

O novo modelo proposto pela AHA para descrever e quantificar a saúde cardiovascular representa uma evolução importante. A incorporação do sono como métrica de saúde cardiovascular, semelhante a outros comportamentos de saúde, pode aumentar os esforços de prevenção de doenças cardiovasculares primordiais em nível populacional. ^(1,2)